sexta-feira, setembro 19, 2008

Ladrão consciente - evolução da bandidagem no país

Hoje saiu em diversos jornais, inclusive foi veiculada no rádio, a conversa entre um ladrão de carros e a polícia. O objetivo era informar que, no carro que ele havia roubado, havia uma criança dormindo no banco de trás. Na hora ele não a tinha visto, mas, tendo notado, abandonou o carro e solicitava, então, que a polícia fosse buscá-la. Ao final da ligação, avisou que se, por acaso, fosse 'pegar' o carro novamente e encontrasse o menino outra vez abandonado, mataria o f.d.p. do pai dele.

Quem diria que eu viveria para ver essa 'catigoria' de bandido, com mais consciência sobre educação de filhos do que o pai de família que largou o rebento de 5 anos dormindo e trancado no carro para tomar umas com a mãe da criança no boteco da esquina.

O que me preocupa nisso tudo - além da segurança dessa criança - é a segurança do bandido. Neste caso, me refiro a outro tipo de segurança - à sua convicção de impunidade. Se ele confiasse um pouco mais na competência da polícia e na eficácia da Justiça, não confessaria descaradamente que tinha roubado o carro, confessaria? Não, não faria isso! No mínimo inventaria uma mentira, poderia talvez dizer que estava passando pela rua e viu um carro com uma criança. Isso após ter tido todo o cuidado de limpar possíveis marcas de digitais.

Se ele acreditasse nas leis do país e da cidade, teria um pouco mais de temor de ameaçar um cidadão de morte para um policial, num telefone de socorro, cujas ligações são gravadas, não teria?

Me atemoriza viver num país em que o poder de decidir quem vive ou morre e o porquê são os bandidos. Castigo por abandonar o filho dormindo no carro: pena capital. Sem direito à defesa (não que merecesse defesa, longe disso!...). Me atemoriza viver num país em que o Estado é mais condescendente com os criminosos do que os próprios criminosos. Pelas leis do nosso Estado, não há pena de morte, nem pena de caráter perpétuo, por mais cruéis que tenham sido os atos de alguém, ou quantas tenham sido suas vítimas. Por mais que tenha sido julgado e suas penas somem mais de 200 anos, ele não poderá passar mais de trinta na cadeia. E, em alguns casos, poderá ser solto após cumprido um sexto da pena. Ainda que seu crime tenha sido assassinato, que tem caráter perpétuo (já que a vítima permanecerá morta para sempre e, ao contrário de seu algoz, nunca vá ter uma segunda chance de reconstruir sua vida, nem sua família, privada precoce e eternamente do convívio com o ente amado).

Me assusta muito ouvir de uma colega que estuda Direito a defesa feita por um professor de Direito Penal para que haja em nossas leis tantos recursos, tantas possibilidades de se escapar da pena. O argumento era: "imagina se for o filho ou o parente de algum de vocês que, por acaso, em um ato impensado comete algum crime?!"

Hmmm. Imaginei. Se algum parente meu, ou se eu, ou se minha filha cometer um crime merece ser adequadamente julgado e, se for o caso, responsabilizado por ele. E não o fato de eu ter ou não dinheiro para pagar um advogado deve determinar se eu serei punida, ou não. Cadê a justiça? Cadê a lei? Cadê a ordem?? E se não há ordem, por que esperar que haja progresso???

segunda-feira, setembro 15, 2008

Bolsa de mulher


Bolsa de mulher sempre dá o que falar. Os homens não entendem o porquê de a gente necessitar levar tanta coisa para fora de casa e a gente se pergunta o mesmo quando tenta, inutilmente, encontrar o celular se estribuchando de tocar perdido em um dos 27 bolsilhos internos.

A despeito disso, o fato é que esse é um hábito difícil de mudar. Melhor dizendo, esse é um hábito que EU não pretendo mudar.

Pensando no assunto, achei por bem fazer um inventário do que não pode faltar na minha bolsa, para que eu não acabe deixando algo para trás:

- carteira com documentos, um cartão de débito e um de crédito e um mínimo de dinheiro - para, em caso de acidentes, eu ser identificada e, em caso de uma necessidade urgente de consumo, não fique a ver navios;
- um batom rosado e outro marrom (para adequar ao tom da roupa);
- delineador e lápis de olho, para quando estiver com cara de defunto no meio do dia;
- um frasco de creme hidratante (porque moro em Brasília);
- chave de casa (porque já fiquei muitas vezes trancada do lado de fora. A pior foi quando tinha viagem marcada e acabei perdendo o vôo);
- chave do carro (em chaveiro separado, para não correr o risco de perder as duas);
- um tablete de comprimidos para cólicas e outro para dor de cabeça (porque infelizmente os necessito com relativa freqüência);
- escova, pasta de dente e fio dental (porque gosto de beliscar alguma coisa no meio da tarde);
- um pacote de halls (azul ou vermelho ou ambos) e um tablete de trident (porque gosto de mastigar alguma coisa no meio do trânsito);
- algum chocolate (porque morro de medo de passar fome no meio de alguma coisa, ou de algum lugar e porque posso ser acometida por uma vontade súbita e incontrolável do doce dos deuses);
- um estojo com caneta de várias cores, lápis, borracha e apontador, porque posso precisar anotar algum recado;
- computador de bolso, para anotar despesas pessoais, gastos com gasolina, e, eventualmente, ser lembrada de alguma tarefa ou aniversário;
- documento do carro (porque a lei me obriga);
- crachá (porque as normas da minha empresa me obrigam);
- um pente largo de madeira (dispensa explicações);
- um prendedor de cabelo (porque se saio com ele solto, não suporto por muito tempo);
- absorvente íntimo - interno e externo - porque nunca se sabe quando se pode precisar (ou quando uma amiga pode precisar);
- celular (ufa, quase que esqueço dele! Bem, na verdade às vezes esqueço mesmo, ou deixo no silencioso o que deixa toda a família com os cabelos em pé).

Bem, acho que agora já posso sair de casa. O problema é quando resolvo trocar de bolsa!

sábado, setembro 13, 2008

Ipês brancos

Nessa época de estiagem aqui em Brasília os ipês são um espetáculo à parte. Os amarelos, que este ano floriram mais tarde, já se foram. Essa semana levei um susto ao ver que os brancos estavam ali, numa sequência de vida e balanço entre as ruas de puro asfalto.

No ano passado esperei para fotografá-los no fim-de-semana e quando cheguei lá não havia sequer uma flor para servir de modelo. Todas já se haviam ido, sem preocupar-se com despedidas. Dessa vez não iria dar bobeira. Nem os prazos para almoço com os pais, retorno ao trabalho, pausa para pegar o óculos da filhotinha que havia ficado pronto seriam empecilhos para a minha jornada. Mudei o rumo do caminho, estacionei onde dava e busquei o melhor ângulo.



Não satisfeita, me dirigi à rua sob o viaduto para vê-los melhor. Parei num canto e pude vê-los de perto, olhar o contraste com o céu azul e assistir ao desfile alvoroçado das pétalas que caíam ao ritmo do vento e já começavam a se amontoar cobrindo o cimento de um macio e sedoso branco neve.





sexta-feira, setembro 12, 2008

Ontem sonhei que estava grávida


Gravidez e maternidade são dois temas bem complexos que fogem dos usuais clichês que costumam defini-las e que habitam o imaginário feminino e masculino.

Ontem sonhei que estava grávida. Assim, de repente. Não me lembro do contexto, apenas da sensação de invasão que me dominou e me fez reviver minha primeira gravidez.

É estranho emprestar o nosso corpo para outro poder desenvolver-se e viver. Exige muita disponibilidade, muita generosidade. É um ato de doação cuja magnitude só encontro similaridade em quem doa um órgão para um ente amado, com as diferenças e ressalvas óbvias entre os dois processos.

Me lembrei de todas as mudanças físicas e das sensações (desagradáveis) que me evocaram. Enjôos, azias, queimações, inchaços, cãimbras fizeram parte do meu cotidiano por vários daqueles nove meses. Por mais que, de maneira geral, tenha curtido muito minha gravidez - sentir e ver pelas ecografias a minha filha crescer dentro de mim, os dedinhos formarem-se, o coraçãozinho bater acelerado, conversar com ela nos engarrafamentos da vida ou na poltrona que usaria para amamentá-la por vários meses, escutar juntas as músicas que até hoje gostamos de ouvir... - não posso afirmar que tenha sido fase de puro prazer. Seria pura e leviana mentira.

Era minha individualidade que estava em jogo. Tudo o que mais prezo, lado-a-lado com a minha liberdade. Os meus desejos transformados, o humor afetado, o esforço para manter a sensatez e analisar as situações com um mínimo de serenidade antes de ter uma reação desbaratada, como numa TPM potencializada e constante. Libido sobe, libido desce, te quero agora, não te quero agora, te quero muito, acho que não te quererei nunca mais... pobre marido que tinha que compreender, aceitar resignado e esperar paciente pelo momento ideal de fazer a coisa certa... Quem era aquela?? Quem estava em controle?... Como é difícil para mim não ter o controle... pelo menos sobre mim mesma!!.. sobre o meu próprio corpo... a única coisa que é indubitável e legitimamente totalmente minha...

E o parto?? Ah, o parto.. aquele para o qual me preparei com mentalizações, aulas de hidroginástica, exercícios do assoalho pélvico e que tinha certeza seria natural, tranqüilo e praticamente indolor.. Ledo engano... Cheguei ao hospital, com contrações de 5 em 5 minutos, após quase seis horas de contrações ainda suportáveis, mas já chegando ao limite do que eu esperava, imaginava já estar com uns 5 cm de dilatação. Quando a médica fez o toque e me disse, sem piedade, que eu estava com 1 cm de dilatação, tive vontade de dar-lhe um soco e mandar que enterrasse seu diploma num buraco bem fundo, mas isso não me adiantaria de nada. Aliás, eu nem tinha força para dar soco algum. Então me resignei e, caminhando feito uma anciã aleijada, me dirigi acompanhada do meu fiel escudeiro, o MariDoulo. O MariDoulo me abanava quando sentia calor, me ajudava a ir ao banheiro, a subir na cama, descer da cama, massageava minhas costas quando eu pedia para socá-las porque a dor parecia que me iria partir ao meio e eu iria sobrar tronco prum lado, pernas para o outro e uma bacia quebrada que não poderia contar a história.

Há quem diga que não há dor no parto, que são sensações que toda mulher deveria experienciar. Eu também acho que as mulheres devem experimentar essa sensação. Mas que é dor, ah isso é! Pelo menos no meu único caso foi. Em inglês existe um termo para definir esse tipo de parto, cuja dor se sente sobretudo nas costas e é muito intensa, segundo os relatos (que eu ratifico!), que é "back labor" (não confundir com "black label", que é bem mais suave e produz sensações bem mais divertidas, embora em termos de resultado, não chegue aos pés, ainda que a ressaca seja bem semelhante!!)

Bem, após essa digressão e voltando à história, após outras cinco horas, injeção de ocitocina, massagem nas costas, exercício respiratório, agacha e levanta, gemido prá lá e gemido prá cá, deita de um lado e de outro, bolsa rompida, líquido amniótico com mecônio, opta-se por fazer uma cesárea - por segurança e talvez por cansaço, também. Pedi pinico! E apesar de uma certa frustração por não ter o esperado parto normal, não posso negar que, após o segundo seguinte daquela anestesia milagrosa, senti-me adentrar no paraíso e cumprimentar todos os anjos e arcanjos um-a-um.

Ver o rostinho dela foi maravilhoso. Ficar três horas sozinha recuperando da anestesia e da noite em claro também foi. Amamentar era como um milagre, sentir a insegurança de não saber se ela estava sendo bem alimentada era um martírio. Pegar na sua mãozinha enquanto via ela mamar era com um sonho, sentir a dor dos mamilos que rachavam pela pega inadequada não teve a menor graça.

Por isso me irritam as generalizações. Não há nada todo bom ou todo mal. Ou se há, não necessariamente o é para todos. Ou todas...