sexta-feira, outubro 30, 2009

Viver é preciso, dirigir não é preciso



Aprendizado que tive na infância, que compartilhei com minha filha e que sempre procuro colocar em prática é: não faça aos outros o que não gostaria que fizessem com você. É tão lógico e natural para mim que tenho a expectativa que todo mundo também pense assim e vá agir assim. E qual a minha surpresa e frustração (e raiva!) quando isso não acontece.

Hoje, atrasada, indo para a aula de ginástica, no movimentado trânsito do Eixo Monumental após o meio-dia, sou surpreendida com um solavanco que arremessa meu carro alguns metros adiante. Foi tudo tão rápido que demorei um tempo para entender. Lembrei dos mandamentos do Código de Trânsito de que não podemos interromper o tráfego de veículo e que, em caso de acidentes, devemos encostar os veículos e tirá-los do fluxo. Foi isso que fiz. Dei seta, fiz sinal para o motorista que bateu na traseira de meu carro e fui encostar ao meio fio. Você encostou? Nem ele (ou ela)! Fez cara de paisagem, arrancou e se mandou. Na confusão não consegui identificar nem veículo, muito menos placa.

Fiquei lá a ver navios e com uma sensação de passar por idiota. Deveria, então, atrapalhar todos atrás de mim, sair do carro rapidamente e ir imediatamente tomar satisfações de quem considerei culpado? Talvez sim.

Na próxima vez, que espero não haja, reverei minha conduta.

quinta-feira, outubro 22, 2009

Um café, com açúcar e com afeto, por favor!

É preta, gorda e linda como acho Tia Anastácia foi. Linda daquela beleza transcendental, metafísica. Se é estética, nao sei. Sei que lhe falta um dente incisivo, mas seu olhar é tão profundo e reluzente que ofusca minha visão. Quando a encontro, corro para o seu abraço, quero seu colo e assim renovo minhas energias, vejo mais sentido nas coisas, sinto como somos capazes de interferir positivamente na vida uns dos outros.

Talvez seja um ato de puro egoísmo. Mas é fato que após esse abraço, torno-me absurdamente mais feliz do que era antes.

É analfabeta, mas sua sabedoria é ancestral, visceral, milenar. Teve três filhos, sendo um casal de gêmeos. A menina ficou surda com um ano de idade após contrair meningite. Cuidou desses três anjos sozinha. Com toda a força que Deus lhe deu.

Não lhe sobra dinheiro, mas seu coração e sua alma são infinitamente ricos de amor e dignidade. Tem 47 anos, mas aparenta 65. Como seria de se esperar de uma brasileira negra, sofrida, obesa e pobre, é hipertensa, tem Chagas e varizes. Mas não sofre de preguiça nem de tristeza. Todos os dias tem um sorriso para oferecer junto à xícara de café.

Um dia lhe roubaram um guarda-chuva na parada de ônibus. Fiquei indignada com o acontecido. Não lhe basta todo o resto ainda tem que voltar para casa na chuva! E ela me disse: 'provavelmente era alguém que precisava mais do que eu...'

Meu profundo reconhecimento, minha maior admiração, todo o meu carinho, afeto e paixão por essa mulher maravilhosa, por essa criatura verdadeiramente humana, minha rainha africana, essa mãe emprestada...

quarta-feira, outubro 14, 2009

Rapidinhas 2

- Minha filha perdeu 4 dentes em uma semana.
- O aquário está cheio de musgos.
- Meu marido está gripado.
- Compramos uma geladeira.
(Que alegria! Mas chegou antes do prazo combinado. Não tínhamos onde colocá-la. Ficou na sala por uma semana)
- Estou tentando ser saudável.
(Comprei linhaça dourada, farinha de quinua real, mas só me sinto rainha após uma barra de chocolate)
- Amiga distante me presenteou com uma maravilhosa caixa de bombons.
(Amigos são para essas coisas!)

sexta-feira, outubro 09, 2009

Avós

Tive o privilégio de conhecer três das minhas quatro bisavós e poder tê-las em minha vida por um bom tempinho. Uma, era cega ao final da vida, consequência da diabetes desenfreada. Outra estava sempre elegante - os cabelos cuidadosamente pintados e bem escovados, os vestidos de tecidos finos (e caros), as unhas sempre feitas e, para complementar, belas jóias, que foram espalhadas por toda a família após sua morte. Outra tinha o hábito infalível de enviar cartões de aniversário pontuais, minuciosamente escritos e deliciosamente carinhosos a todos os membros de sua família de 7 filhas, 20 netos, muitos bisnetos e todos os respectivos cônjuges. Ao final, o dinheiro era curto, então mandávamos respostas já com selos, para contribuir com a tradição.

Hoje minhas bisavós já se foram, mas convivo com minhas duas avós, que já passaram dos 80, mas conservam a energia e a jovialidade que às vezes me falta.

Uma nasceu carioca, só teve um irmão que morreu moço. Casou-se, teve três filhos, separou-se. Sempre gostou de política e economia e de fazer festas em sua casa.
A outra nasceu na roça, numa fazenda em São Paulo, segunda filha numa prole de sete mulheres, cresceu no Rio de Janeiro, casou-se, teve seis filhos. Sempre gostou de dança e obras de arte.

Uma fazia o melhor rosbife e o melhor creme de milho que já experimentei. A outra, o melhor bolo de caixa com cobertura de laranja açucarada e um suco de caju (de garrafa) doce de doer as bochechas.

Uma teve uma carreira sólida de auditora, aposentou-se relativamente jovem, num cargo importante, por uma doença incapacitante. Outra foi dona de casa, costureira, vendedora de comésticos, fez concurso público quase aos 40 anos de idade e aposentou-se aos 70, na compulsória.

Uma separou-se após 25 anos de casamento e sofreu muito com isso. Outra enterrou o marido após 57 anos de convivência e também sofreu muito com isso.

Uma lê jornais diariamente e conversa de política, economia e relações internacionais. Outra conversa de coisas do agora e do passado, do que houve e do que talvez não tenha havido. Uma gosta de novela. Outra, da Hebe Camargo.

Uma me levou a Disney e dividiu comigo uma cabine em meu primeiro cruzeiro marítimo. Outra deixava a gente viajar no seu closet de roupas e sapatos e no seu armário de bijouterias e maquiagens.

Uma ía semanalmente à feira e nos comprava biscoitos deliciosos. Outra arrumava uma cama de edredons no chão, onde dormiam 7 netos para descanso de seus pais.

Uma me ensinou coisas do mundo, Outra, coisas de pessoas. Ambas me mostraram o valor do estudo, do trabalho, do caráter e da honra.

Uma tem angina pectoris há vários anos. Outra curou-se de dois cânceres e fez duas pontes coronarianas. Ambas são fortes e vencedoras.

Minhas duas avós são maravilhosas, moram em meu coração e são parte do que sou, do que acredito e do que vivo. A elas, meu eterno agradecimento e imenso afeto.

terça-feira, outubro 06, 2009

Educação emocional

Trabalho há algum tempo com desenvolvimento humano nas organizações e por isso estou sempre estudando uma ou outra coisa relacionada ao autoconhecimento, às interações humanas, ao desenvolvimento de competências intra e interpessoais. Participo de cursos e faço psicoterapia, o que também me mantém sempre em processo de reflexão e aprendizagem.

Mas essa não é uma rotina para todos. Vivemos numa sociedade racionalista, que valoriza o pensamento, o lógico, o cognitivo, a mente e rebaixa, rechaça ou ignora a emoção, o sentimento, o corpo. Por desconhecer, por não compreender, chegamos a temê-los. Acreditamos que se uma decisão é baseada em emoção é equivocada, duvidamos de que um problema de fundo emocional possa levar ao adoecimento físico, como se fôssemos compostos de partes independentes e desintegradas.

Agora estou lendo um livro que tenho gostado muito - Fundamentos da Educação Emocional, de Juan Casassus, publicado pela Unesco. Coloco aqui alguns pontos que considero bastante relevantes.

"É importante reconhecer o poder das emoções no que concerne a sua capacidade de nos revelar a nós mesmos e fazer com que sejamos pessoas melhores, vivendo uma vida mais plena e consciente. A educação emocional trata disso. É possível aprender experimentando, analisando e compartilhando. Mas o conhecimento das emoções não é adquirido somente pelas palavras. Aprende-se muito mais por meio das ações, vivendo num contexto de apreço verdadeiro, de tolerância, vendo bons exemplos de interrelações, vivendo essas interrelações."

Considerar isso é particularmente importante para pais. Não basta educar os filhos em relação a bons modos e etiqueta social, não basta fornecer meios de aprendizagem focada em competências cognitivas e que levem posteriormente à realização de ofícios e à inserção no mundo do trabalho. É preciso educar co-viver, para viver com o outro, para respeitar o outro e o ambiente vivo que habitamos, que é a nossa casa e que também é parte de nós.

"As emoções são a chave de nossa sobrevivência. Sempre o foram. Se estamos aqui hoje como espécie, é porque, desde o início de nossa evolução, se desenvolveu em nosso cérebro (reptiliano) a capacidade de sentir e nos adaptar ao entorno. O medo nos permitiu reagir diante do que nos ameaçava, enquanto o desejo nos permitiu alimentar e reproduzir a espécie. As emoçõe estiveram no centro de nossa capacidade de sobreviver. A capacidade emocional é a força que nos impulsiona a adaptar e transformar nossos entornos externos e internos: está no centro de nossa capacidade de evoluir. (...) As emoções representam o campo vital para cada um. O que sentimos sobre nós mesmos determina em grande medida quem somos."

Por isso somente quando começamos a perceber o que sentimos (tomar consciência), a reconhecer o que sentimos (saber nomear as emoçoes) é que podemos chegar a terceira etapa de domesticar a emoção. Esses são processos internos que caracterizam a regulação emocional. Para Casassus, as emoções não são negativas ou destrutivas, nem positivas, ele as considera como neutras. O que não é neutro é o que pensamos e fazemos quando estamos emocionados.

Como pais, precisamos desenvolver nossa competência de regulação emocional. As crianças muitas vezes exibem comportamentos que nos levam a sentir raiva. Não precisamos sentir culpa por isso. Precisamos reconhecer que não somos as nossas emoções. Preciso tomar consciência da emoção da raiva, identificar as circunstâncias em que sou tomado por ela (isso permitirá mudar o meu padrão de resposta e me libertar de comportamentos inadequados) e, assim, escolher como agir. Não é porque sinto raiva ou mágoa ou indignação é que vou agredir o meu filho. Se ele demonstrou um comportamento inadequado, mesmo que isso me desencadeie emoções fortes, como raiva, preciso ter consciência de que o importante no momento é controlar minha emoção, para poder tomar uma atitude coerente com minhas crenças e meus valores - educo pelo diálogo, educo pelo exemplo, educo com amor e com afeto. Depois posso continuar meu processo de autoconhecimento e regulação de minhas emoções com tranquilidade...

É assim também que ensino a minha filha a entender o que sente, a expressar o que sente, a pensar e refletir sobre o que sente, a escolher como agir a partir de uma ou outra emoção. É fácil? É um treino constante...

Sugestão de outros títulos sobre o tema:

- Desenvolvimento Interpessoal: Treinamento em Grupo, de Fela Moscovici, Editora José Olympio, 2008.

- A Inteligência Emocional, de Daniel Goleman - Editora Objetiva