sexta-feira, setembro 12, 2008

Ontem sonhei que estava grávida


Gravidez e maternidade são dois temas bem complexos que fogem dos usuais clichês que costumam defini-las e que habitam o imaginário feminino e masculino.

Ontem sonhei que estava grávida. Assim, de repente. Não me lembro do contexto, apenas da sensação de invasão que me dominou e me fez reviver minha primeira gravidez.

É estranho emprestar o nosso corpo para outro poder desenvolver-se e viver. Exige muita disponibilidade, muita generosidade. É um ato de doação cuja magnitude só encontro similaridade em quem doa um órgão para um ente amado, com as diferenças e ressalvas óbvias entre os dois processos.

Me lembrei de todas as mudanças físicas e das sensações (desagradáveis) que me evocaram. Enjôos, azias, queimações, inchaços, cãimbras fizeram parte do meu cotidiano por vários daqueles nove meses. Por mais que, de maneira geral, tenha curtido muito minha gravidez - sentir e ver pelas ecografias a minha filha crescer dentro de mim, os dedinhos formarem-se, o coraçãozinho bater acelerado, conversar com ela nos engarrafamentos da vida ou na poltrona que usaria para amamentá-la por vários meses, escutar juntas as músicas que até hoje gostamos de ouvir... - não posso afirmar que tenha sido fase de puro prazer. Seria pura e leviana mentira.

Era minha individualidade que estava em jogo. Tudo o que mais prezo, lado-a-lado com a minha liberdade. Os meus desejos transformados, o humor afetado, o esforço para manter a sensatez e analisar as situações com um mínimo de serenidade antes de ter uma reação desbaratada, como numa TPM potencializada e constante. Libido sobe, libido desce, te quero agora, não te quero agora, te quero muito, acho que não te quererei nunca mais... pobre marido que tinha que compreender, aceitar resignado e esperar paciente pelo momento ideal de fazer a coisa certa... Quem era aquela?? Quem estava em controle?... Como é difícil para mim não ter o controle... pelo menos sobre mim mesma!!.. sobre o meu próprio corpo... a única coisa que é indubitável e legitimamente totalmente minha...

E o parto?? Ah, o parto.. aquele para o qual me preparei com mentalizações, aulas de hidroginástica, exercícios do assoalho pélvico e que tinha certeza seria natural, tranqüilo e praticamente indolor.. Ledo engano... Cheguei ao hospital, com contrações de 5 em 5 minutos, após quase seis horas de contrações ainda suportáveis, mas já chegando ao limite do que eu esperava, imaginava já estar com uns 5 cm de dilatação. Quando a médica fez o toque e me disse, sem piedade, que eu estava com 1 cm de dilatação, tive vontade de dar-lhe um soco e mandar que enterrasse seu diploma num buraco bem fundo, mas isso não me adiantaria de nada. Aliás, eu nem tinha força para dar soco algum. Então me resignei e, caminhando feito uma anciã aleijada, me dirigi acompanhada do meu fiel escudeiro, o MariDoulo. O MariDoulo me abanava quando sentia calor, me ajudava a ir ao banheiro, a subir na cama, descer da cama, massageava minhas costas quando eu pedia para socá-las porque a dor parecia que me iria partir ao meio e eu iria sobrar tronco prum lado, pernas para o outro e uma bacia quebrada que não poderia contar a história.

Há quem diga que não há dor no parto, que são sensações que toda mulher deveria experienciar. Eu também acho que as mulheres devem experimentar essa sensação. Mas que é dor, ah isso é! Pelo menos no meu único caso foi. Em inglês existe um termo para definir esse tipo de parto, cuja dor se sente sobretudo nas costas e é muito intensa, segundo os relatos (que eu ratifico!), que é "back labor" (não confundir com "black label", que é bem mais suave e produz sensações bem mais divertidas, embora em termos de resultado, não chegue aos pés, ainda que a ressaca seja bem semelhante!!)

Bem, após essa digressão e voltando à história, após outras cinco horas, injeção de ocitocina, massagem nas costas, exercício respiratório, agacha e levanta, gemido prá lá e gemido prá cá, deita de um lado e de outro, bolsa rompida, líquido amniótico com mecônio, opta-se por fazer uma cesárea - por segurança e talvez por cansaço, também. Pedi pinico! E apesar de uma certa frustração por não ter o esperado parto normal, não posso negar que, após o segundo seguinte daquela anestesia milagrosa, senti-me adentrar no paraíso e cumprimentar todos os anjos e arcanjos um-a-um.

Ver o rostinho dela foi maravilhoso. Ficar três horas sozinha recuperando da anestesia e da noite em claro também foi. Amamentar era como um milagre, sentir a insegurança de não saber se ela estava sendo bem alimentada era um martírio. Pegar na sua mãozinha enquanto via ela mamar era com um sonho, sentir a dor dos mamilos que rachavam pela pega inadequada não teve a menor graça.

Por isso me irritam as generalizações. Não há nada todo bom ou todo mal. Ou se há, não necessariamente o é para todos. Ou todas...

2 comentários:

Flavinha disse...

Oi JU!

Será que esse sonho não é um sinal, não?

Legal seu depoimento tão real quanto ao lance da gravidez e do parto! Eu que estou querendo passar por isso em breve consegui com ele colocar pelo menos um pezinho no chão!

Beijos

Juliana Werneck disse...

Pois, passe sim! Se este é um desejo seu, você vai amar!!! E lembre-se que cada caso é um caso, pode ser que você não vá ter nem um enjôo, nem um dedinho inchado!! :-)
Bjs, Ju.