quarta-feira, dezembro 10, 2008

A culpa é da mãe


Todos os temas que dizem respeito ao universo feminino me interessam a priori. O fato de ter nascido mulher neste mundo influenciou totalmente a minha vida e a minha existência. Não sou simplesmente um ser humano. Sou mulher. Tudo bem, esse não é o único fator - nasci na década de 70, em Brasília, no Brasil, em família de classe média. Fatores externos, sobre os quais não tive qualquer gerência e que se misturam com a minha história e com as minhas escolhas e resultam no que sou, no que faço, no que gosto ou desejo.

Mas voltemos à situação da mulher no Brasil. Estão se tornando maioria, estudam mais, ocupam um lugar significativo no mundo do trabalho, mas ainda ocupam posições de menor destaque e ganham menos que os homens. Ainda que tenha havido progressos significativos nos últimos anos, no que se refere a aspectos sociais, políticos e econômicos, ainda há muito o que se avançar nas relações pessoais e domésticas. Ainda somos um país essencialmente machista. Nossas mães são machistas. Ainda repetimos o bordão de que "em briga de marido e mulher ninguém mete a colher". Ainda escutamos falar que tem mulher que gosta de apanhar. Ainda achamos que cabe prioritariamente à mulher a responsabilidade pelas tarefas domésticas e pelos cuidados com os filhos. Ainda imputamos a elas toda a responsabilidade de zelar pelas crianças que são abandonadas pelos pais que a fizeram - às vezes à força - antes que colocassem seus inocentes olhos neste mundo.

Neste ponto quero abrir um parênteses. Não aguento mais assistir nos jornais verdadeiras situações de "caça às bruxas" ops! caça às mulheres que, em momento de desespero, largam seus filhos recém-nascidos à própria sorte em algum lugar. Não quero defender essa atitude. Mas quero que se culpabilize não somente a mãe, mas também o pai.


Maternidade - Di Cavalcanti

Onde estava esse homem quando sua esposa, companheira, amante, namorada ou sua mulher num momento furtivo, que teve seu corpo transformado pela gravidez, que carregou o peso do bebê e da solidão por 9 meses, que sentiu dor, medo, fraqueza, insegurança, incerteza, abandonou o próprio filho que acabou de gerar? Onde está aquela cumplicidade (ou no mínimo a parceria, a solidariedade) do momento do gozo? Aliás, a palavra é essa mesmo: cumplicidade.


Bordel - Di Cavalcanti. Fonte: www.bolsadearte.com

Que se responsabilize a autora do crime e seu primeiro cúmplice: o pai da criança. Muitas vezes existem outros: a família, os vizinhos, a comunidade, a igreja, o Estado. Por que as coisas não são mais claras? Por que tanto tabu em torno da sexualidade e as conseqüências de sua prática? Por que não existam leis que facilitem os processos de adoção? Se em nosso país o aborto é proibido por que não existem campanhas para orientar sobre o que as mulheres podem fazer em caso de gravidez indesejada? Por que instituições policiais, de saúde, de direitos humanos, de assistência social ... não conseguem prevenir situações assim?? Por que quando essas coisas acontecem a culpa é toda da mãe???


Maternidade, 1937. Di Cavalcanti.

Um comentário:

Luiza Helena disse...

Oi
É por isso que sou sua fã!
Você consegue dizer com todas as letras aqueles pensamentos que me rondam a cabeça e ainda não tive coragem pra falar.
Beijos,