terça-feira, abril 08, 2008

Da tolerância, uma das qualidades fundantes da vida democrática*


Paulo Freire in Pedagogia da Tolerância. Org. Por Ana Maria Araújo Freire. São Paulo: Editora UNESP, 2004

* Trecho de texto que teria sido a 3ª Carta do livro de Paulo Freire Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos, mas por ele ainda inacabado no momento em que o índio pataxó Galdino Jesus dos Santos faleceu, em 21 de abril de 1997.

Daqui a alguns dias completará 9 anos do fato motivador deste texto, do qual transcrevo partes. Ele fala de um assunto que muito me motiva e me interessa e que representa aspecto fundamental para a interação e a convivência ética, pacífica e democrática dos seres humanos, das sociedades, das famílias.

Não consigo enxergar alguma forma de relacionamento ou interação saudável, enriquecedora para ambas as partes, sinérgica que prescinda da aprendizagem e da prática do respeito e da tolerância. Costumo dizer que são pressupostos para os processos de comunicaçao verdadeiros entre as pessoas.

“(...) Falo da tolerância como virtude da convivência humana. Falo, por isso mesmo, da qualidade básica a ser forjada por nós e aprendida pela assunção de sua significação ética – a qualidade de conviver com o diferente. Com o diferente, não com o inferior.

A tolerância verdadeira não é condescendência nem favor que o tolerante faz ao tolerado. Mais ainda, na tolerância verdadeira não há propriamente "o" ou "a" que tolera e "o" ou "a" que é tolerado (a). Ambos se toleram.

Por isso mesmo, na tolerância virtuosa não há lugar para discursos ideológicos, explícitos ou ocultos, de sujeitos que, julgando-se superiores aos outros, lhes deixam claro ou insinuam o favor que lhes fazem por tolerá-los.

(...) O que a tolerância autêntica demanda de mim é que respeite o diferente, seus sonhos, suas idéias, suas opções, seus gostos, que não o negue só porque é diferente. O que a tolerância legítima termina por me ensinar é que, na sua experiência, aprendo com o diferente.

Há algo que me parece fundamental e que até prévio a qualquer indagação em torno da tolerância é que ela é uma instância da existência humana.

Só entre mulheres e homens, seres finitos e conscientes de sua finitude, seres que, por natureza, são substantivamente iguais, é que se pode falar em tolerância ou intolerância. Não é possível conjecturar em torno da tolerância entre tigres ou entre mangueiras e jaqueiras.

É neste sentido que a tolerância é virtude a ser criada e cultivada por nós enquanto a intolerância é distorção viciosa. Ninguém é virtuosamente intolerante assim como ninguém é viciosamente tolerante.”

Um comentário:

Keiko disse...

Ótimo texto Ju! Super pertinente para tudo, eu estava debatendo justamente sobre estes conceitos sábado a noite com uns amigos, falando de inclusão de pessoas com necessidades especiais.E falando sobre Paulo Freire em um curso aqui, sobre as relações de poder na sociedade.

Acho que este é um princípio fundamental e no entanto muito difícil de ser transmitido com clareza para os nossos pequenininhos em uma sociedade cheia de ruídos intolerantes...

Beijinho,
Keiko